Onde está a explicação da popularidade do governo? Em que sentido muito genérico se pode dizer que é a política econômica que a ancora? O quê da política econômica? Se não é o modo como o governo age em relação à inflação, ao emprego, à renda, se não é a política tributária e a de juros?
Os resultados da mais recente pesquisa do Ibope, realizada para a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e divulgada na semana passada, devem ter deixado o Planalto muito satisfeito. São, de fato, animadores para o governo, porque mostram que tudo continua como antes, ou seja, com elevada popularidade para o presidente. Quando as coisas vão bem, boa notícia é não haver notícias.
É o enésimo momento em que Lula ultrapassa olimpicamente o que poderia ser uma dificuldade. Não que a de agora fosse mais grave que outras, pois a crise aérea do início do ano e o acidente com o avião da TAM tinham maior potencial de desgaste. Afinal, o assunto Renan sempre esteve dentro do Senado e do Congresso, prejudicando uma imagem que era já ruim. Ainda que o governo não houvesse feito o que parte da opinião pública esperava dele, se desvencilhando de maneira mais clara do indigitado, não se supunha mesmo que o prejuízo viesse a ser grande.
Assim, pelo menos no que se refere ao presidente, o affair Renan passou em branco, sem respingar, de maneira visível, nos números da popularidade. Se afetou outros personagens, só saberemos mais tarde.
Esse novo exemplo da invulnerabilidade de Lula provocou, como já havia ocorrido antes, mais uma rodada de explicações "econômicas" de um resultado de pesquisa. Seguindo a linha "a economia garante a popularidade de Lula", a maioria dos observadores julgou que o levantamento pouco tinha de realmente interessante.
Essa talvez seja uma leitura precipitada. Algo bem curioso está nos resultados divulgados, exatamente nos que tratam das percepções e sentimentos sobre a economia.
Vistos em conjunto, mostram que a grande maioria da população está descontente com as principais medidas da política econômica e com expectativas muito negativas sobre o futuro de nossa economia. Com resultados como esses, se poderia, até, justificar o oposto, um governo em crise de popularidade.
Senão, vejamos. Todas as ações do governo na economia obtiveram níveis de aprovação aquém de 50% e algumas atingiram índices muito baixos: a política de combate ao desemprego foi reprovada por 53% dos entrevistados, a política de juros por 59% e a de combate à inflação só foi aprovada por 44%. O recorde negativo está na política tributária, com 67% dos entrevistados dizendo reprová-la.
Coerentes com isso, 85% disseram que os impostos são altos demais para a qualidade dos serviços públicos existentes e não mais que 17% consideraram que a CPMF devia ser renovada. Ou seja, a principal batalha do governo no Congresso, este ano (em nome da qual se aceitou de tudo), terá um resultado desaprovado por 83% da população.
Olhando para frente, os brasileiros vêem nuvens negras. Na inflação, 52% esperam aumento e 15% redução, restando 28% que imaginam que vai ficar como está, o que pode não ser um número tão desfavorável, pois ela está mesmo baixa. Mas, no desemprego, uma das maiores preocupações do país, o quadro é péssimo: 52% acham que vai piorar e 19% que "não vai mudar", isto é, vai continuar a ser ruim.
Para completar, nas expectativas a respeito da renda, as pessoas se mostram pessimistas: apenas 31% dos ouvidos esperam que ela aumente, contra 26% que diminua e 38% que não mude, ou seja, que permaneça baixa.
Onde, então, está a explicação da popularidade do governo? Em que sentido muito genérico se pode dizer que é a política econômica que a ancora? O quê da política econômica? Se não é o modo como o governo age em relação à inflação, ao emprego, à renda, se não é a política tributária e a de juros?
Será que é só a Bolsa Família? Ou será que é ela e mais uma economia que funciona, aos olhos da população, independente da política econômica?
Marcos Coimbra, Sociólogo e Presidente do Instituto Vox Populi